Em julgamento, o juiz das garantias
A questão levada à douta decisão da Corte Suprema é relativamente simples, e nem deveria ser objeto de contestação judicial, por ser irretorquível, tendo em vista sua…
A medida era aplicada antes da condenação definitiva
Por Antonio Ruiz Filho
O Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, que a prisão especial para quem tem curso superior não foi recepcionada pela Constituição de 1988, por atentar contra a necessária igualdade de todos perante a Lei.
O primeiro ponto a destacar é que a chamada prisão especial – prevista pelo art. 295, VII, do Código de Processo Penal – aplica-se a quem, alcançado pelo rol de possibilidades legais, seja preso antes da condenação definitiva por alguma das modalidades de prisão provisória.
Essa regalia, realmente, era algo do passado, inexplicável a partir da Constituição cidadã. Mas, na prática dos nossos depósitos de gente, havia quando muito, para distinguir a prisão especial dos diplomados, apenas a separação desses presos em relação aos demais, ainda assim inconcebível. O grau de formação educacional não pode ser objeto de qualquer distinção para esse fim.
Veja-se que o art. 295 do CPP, a par da decisão adotada pelo STF, ainda conserva a prisão especial para outras situações que bem poderiam ser reavaliadas, mas que não estavam no escopo da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), intentada em 2015 pelo então procurador-geral da República e somente agora julgada.
Por fim, não há muito o que comemorar. A par dessa decisão, considerada civilizatória, fato é que o nosso sistema prisional, seja para prisões antecipadas, seja para o cumprimento de pena, não oferece o mínimo de dignidade humana, chaga profunda para um país que pretende atingir o status de uma moderna e promissora democracia. Afinal, também estabelece a Constituição que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante” (art. 5º, III, CF).
Fonte: ADPF 334
O acordo de não persecução penal (ANPP) foi introduzido na nossa legislação pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019) e a sua aplicação poderá ocorrer – não sendo o caso de arquivamento da investigação – quando houver confissão formal e circunstanciada da prática de infração penal sem violência ou grave ameaça por parte do investigado, cuja pena mínima seja inferior a 4 (quatro) anos.
Observadas essas circunstâncias, o Ministério Público poderá propor o ANPP para evitar a ação penal (acordo até aqui considerado faculdade da acusação e não direito subjetivo do acusado), mediante uma série de condições previstas no art. 28-A e incisos do Código de Processo Penal.
Desde a sua implantação, a retroatividade do ANPP tem sido motivo de debate. Recentemente, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu por unanimidade, acompanhando o voto do ministro relator Ricardo Lewandowski, que o ANPP, reconhecido como regra de natureza mista (penal e processual) deve ser aplicado a casos que tramitavam antes da sua vigência (mesmo que até essa data ainda não haja confissão), por ser medida mais favorável ao réu. Na ocasião, reiterou-se precedente (HC 180.421), no sentido de que a necessidade de manifestação da vítima para o prosseguimento da acusação por estelionato também deve retroagir (art. 171, § 5º, do CP, incluído pelo mesmo pelo Pacote Anticrime).
A matéria relativa ao ANPP, voltará à discussão no HC 185.913, afetado ao plenário do STF.
Tanto o ANPP como a manifestação da vítima para o início da ação penal por estelionato (a ação passa a ser publica condicionada à representação) são medidas que têm o objetivo de mitigar o princípio da obrigatoriedade da ação penal e buscar o ressarcimento dos prejuízos ao lesado em casos não violentos, assim desimpedindo a Justiça Criminal para cuidar de crimes mais graves.
Por Antonio Ruiz Filho
O STF decidiu recentemente que há necessidade de realização de audiência de custódia para todas as modalidades de prisão possíveis de ocorrer pela nossa legislação, com a apresentação do preso ao juiz em 24 horas, assim ampliando, sobremaneira, o espectro de utilização do instituto. Antes disso, havia essa obrigação legal apenas para casos de prisão em flagrante delito (art. 310 do Código de Processo Penal).
Na audiência de custódia, o juiz poderá decidir entre transformar o flagrante em prisão preventiva (a requerimento da acusação), estabelecer medidas cautelares diversas da prisão (como o uso de tornozeleira eletrônica) ou restituir a liberdade, conforme as necessidades de cada caso. Isso considerando os fatos, as provas até então produzidas, e as condições pessoais do preso, o que sempre contribui para melhor adequação das restrições à liberdade a serem implementadas.
O instituto da audiência de custódia é frequentemente mal compreendido e criticado, como se constituísse uma espécie de válvula capaz de libertar criminosos logo após à prisão – servindo de incremento à insegurança de que todos nos ressentimos. O que se vê na prática forense, no entanto, é exatamente o contrário.
Além de ser um potente remédio para evitar abusos na condução de prisões pela Polícia, as audiências de custódia ainda se prestam a evitar que pessoas que não ofereçam risco real à sociedade deixem de entupir ainda mais os nossos fétidos presídios.
Andou bem a Suprema Corte nessa matéria.